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A trajetória do CNPq

Manuel Domingos Neto (Professor da Universidade Federal do Ceará e Vice-Presidente do CNPq em 2003-2006

Introdução

Este texto reúne comentários sobre a contribuição do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para a construção do Brasil moderno; trata do surgimento, da trajetória funcional e de aspectos da atuação dessa entidade.

O Brasil conta atualmente com importantes instituições de ensino e pesquisa, cerca de 2000 cursos de pós-graduação e forma mais de oito mil doutores por ano; pode qualificar profissionais de alto nível em todas as áreas do conhecimento e em quase todas as especialidades. Mesmo com grandes limitações infra-estruturais e proventos reduzidos, o cientista brasileiro mostra empenho e criatividade, ganha reconhecimento internacional e, em diversas especialidades, disputa prestígio com colegas de países mais desenvolvidos.

O desempenho do pesquisador brasileiro é obscurecido por sua pouca expressividade nos indicadores estatísticos internacionais e por sua limitada repercussão socioeconômica. Mas os indicadores usuais da produção científica (quantidade de artigos publicados e de patentes registradas) apresentam consistência e valor discutíveis, sobretudo para estimar aspectos qualitativos e impactos sociais. A comparação de dados estatísticos de países com tradições, dimensões e possibilidades distintas pode inclusive induzir a graves equívocos. Além disso, quem detém conhecimentos importantes, capaz de conferir superioridade bélica ou comercial, não costuma divulgá-los em periódicos.

Quanto à apropriação social do trabalho científico, é algo que transcende a vontade do cientista e o desempenho pontual de instituições como as universidades e agências de fomento, por mais que elas se empenhem neste sentido. O aproveitamento da pesquisa na indústria, nos serviços públicos, nas políticas sociais depende das opções estratégicas de quem exerce o poder, da cultura e do interesse de empresários e governantes. O Brasil, de fato, não baseia o seu desenvolvimento em um saber produzido internamente; baseia de forma muito limitada o crescimento econômico à complexidade tecnológica, ou seja, restringe a ampliação de suas possibilidades mercantis.

Não obstante, comparando-se a atual capacidade científica e tecnológica brasileira com a de 50 anos atrás, quando a maioria das instituições hoje consolidadas sequer existia, as diferenças são notáveis.

O CNPq cumpriu importante papel na formação desta capacidade; ao longo de seus 54 anos de existência, oferece cerca de 900 mil bolsas-ano de diversas modalidades, apóia pesquisas em todas áreas do conhecimento, assegura a presença de milhares de brasileiros em importantes instituições estrangeiras e a estada no Brasil de influentes profissionais estrangeiros. No CNPq nascem diversos institutos científicos renomados.(1)

Ao longo de sua trajetória, o Conselho, entre outras coisas, credencia e impulsiona programas de pós-graduação; reconhece formalmente novas áreas do conhecimento e fomenta a investigação de novos objetos estudos; incentiva o intercâmbio de pesquisadores e instituições, ampara publicações especializadas, equipa laboratórios e universidades, financia expedições, fortalece as agências estaduais de fomento e amplia o acesso da sociedade brasileira à cultura científica.

O CNPq detém hoje o maior banco de currículos da América Latina; nenhuma outra instituição mantém mais contato direto com pesquisadores em atividade. O sistema de avaliação por pares que adota lhe permite conferir o selo de qualidade mais disputado pela comunidade brasileira de pesquisadores. O CNPq integra um aparelho de Estado de complexidade crescente. Assim, para observar sua trajetória, é preciso considerar o processo sócio-político brasileiro, em particular as orientações dos segmentos sociais politicamente hegemônicos.

Por outro lado, na formação da capacidade brasileira de produzir saber, é impossível eludir as especificidades do trabalho intelectual, que tem dinâmica própria, não pode ser estritamente controlado pelo poder e não se volta necessariamente para os interesses da sociedade. Como toda instituição com forte presença de trabalhadores intelectuais, o CNPq reflete em boa medida as tensas relações entre a comunidade de pesquisadores e o poder.

Neste trabalho amparo-me na literatura disponível sobre o CNPq, aliás, ainda modesta. Utilizo documentos oficiais, em particular a coleção de atas das reuniões do Conselho Deliberativo (CD) do órgão, relatórios anuais de sua diretoria executiva, discursos e entrevistas de seus presidentes e informações de funcionários e cientistas.


O surgimento do CNPq

A produção, difusão e uso do conhecimento preocupam os governantes ao longo da história. No tempo moderno, essa preocupação é avivada pela disputa por mercados e pela grande capacidade dos engenhos destrutivos. O desenvolvimento econômico baseia-se em descobertas e invenções; as guerras revelam a estreita associação entre o trabalho dos pesquisadores e a afirmação das entidades políticas legitimadas: sem ciência e tecnologia, nenhum Estado nacional se defende militarmente, fomenta o progresso econômico e satisfaz as demandas sociais.

Ao longo do tempo, novidades como o motor à explosão, a eletricidade, a aeronáutica, o rádio, a energia nuclear, os medicamentos, as técnicas agrícolas, os satélites e a informática alteram as condições sociais, excitam a imaginação coletiva e induzem governantes a cuidar sistematicamente do ensino de massa, da formação de quadros e do apoio à pesquisa científica.

No Brasil, até a Revolução de 1930, estão em pauta o conhecimento do território, o inventário das riquezas naturais passíveis de exploração econômica, o combate a pragas na agricultura, a modernização das grandes cidades e o controle de endemias. Engenheiros, sanitaristas, médicos, mineralogistas, biólogos, botânicos e agrônomos são os portadores de saber mais prestigiados.

Outros intelectuais, como os antropólogos, historiadores, estudiosos da economia, juristas e críticos literários, geralmente movidos pela vontade de indicar rumos à sociedade, tentam desvendar os traços da identidade nacional, as especificidades do Estado brasileiro, o funcionamento das instituições e os obstáculos ao desenvolvimento.

Muitos, a rigor, são quase autodidatas: o país dispõe de raras instituições de ensino superior e pesquisa, o apoio governamental aos cientistas é débil e pouco sistemático, faltam equipamentos, laboratórios e bibliotecas. A noção de que o conhecimento é permanentemente renovado, de que as teorias estão sempre sujeitas a revisão e de que o aprendizado deve estar associado à investigação e a criação é pouco disseminada; o valor do saber especializado, ensejado por cursos de pós-graduação e pela dedicação exclusiva, é praticamente desconhecido; não há mecanismos formais de aferição do mérito para o trabalho científico.

Nesse panorama, as escolas militares se destacam, em particular as do Exército. Desde o século XIX, profissionais formados nas academias militares ganham lugar nas instituições de ensino, nas academias literárias e na direção de empreendimentos complexos. Modernizado após a Primeira Guerra mundial, o Exército é pioneiro na institucionalização da formação continuada e permanente de quadros profissionais.

Com as rupturas verificadas no país a partir de 1930, os militares ampliam sua influência e, entre 1937 e 1945, empenham-se de forma discricionária na redução da defasagem entre a corporação modernizada e o país que a mantém. O sistema de ensino é alterado e surgem as primeiras universidades, mas o Estado persiste sem instrumentos eficazes para apoiar a pesquisa e a pós-graduação. A Segunda Guerra mundial (1939-1945), aprofundando a distância entre o país e as potências detentoras de conhecimento científico e tecnológico, induz alterações nesse quadro.

O Brasil não conseguira defender sua costa de submarinos inimigos durante o conflito e, para enviar soldados à Europa, dependera inteiramente do suporte norte-americano. Num mundo eletrizado por invenções extraordinárias, pelo desenvolvimento industrial e pela intensificação do comércio, suas possibilidades de trocas internacionais persistem baseadas na produção agrícola e no extrativismo vegetal que, após a Guerra, têm seus preços reduzidos.

Todavia, é um país mais bem identificado, mais ciente de suas potencialidades e ávido de mudanças. O Estado Novo usara a escola, o rádio, a literatura e a arte na exaltação do sentimento nacional; promovera grandes símbolos da identidade brasileira e disseminara a importância do conhecimento. Paralelamente, a experiência socialista animara o confronto político, inspirando demandas que não seriam atendidas sem iniciativas estratégicas.

Os impactos da bomba atômica, a corrida armamentista e a disputa por mercados impulsionam em todo o mundo o fomento ao trabalho dos pesquisadores; cresce o respeito aos cientistas, em particular, o prestígio dos físicos. Em 1948, é organizada a Sociedade Brasileira para Progresso da Ciência; em 1949, surge o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e, em 1950, o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA). Em 1951, são criados o Conselho Nacional de Pesquisa – CNPq e a Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior – CAPES.(2)

A criação do CNPq não atende a interesses econômicos específicos; responde a uma confluência de vontades: a da comunidade científica excitada pelas revelações da Guerra, carente de reconhecimento e amparo material; a dos militares, ansiosos por um instrumento sem o qual estaria congelada a assimetria dos meios de defesa, o engenho nuclear; a de letrados urbanos de variados matizes ideológicos interessados na superação da economia agro-exportadora e da dependência externa; a de industriais necessitados de novas tecnologias e, finalmente, a de governantes em busca de legitimidade por meio de acenos ao padrão moderno.

Disseminada a idéia de que ao Estado cumpre planejar o desenvolvimento, o Congresso Nacional acata a criação do CNPq. O decreto que regulamenta esta entidade revela intenções grandiosas: o órgão surge tendo em vista o bem estar humano e os reclamos da cultura, da economia e da segurança nacional.

Concebido como autarquia subordinada diretamente à presidência da República, o CNPq é encarregado de promover e estimular a pesquisa científica e o desenvolvimento tecnológico em qualquer área do conhecimento, conforme a Lei que o cria. De fato, destina-se especialmente à busca da tecnologia nuclear. A mesma Lei, inclusive, define a posição governamental sobre o tema: proíbe a livre exportação de minerais estratégicos e atribui ao novo órgão a responsabilidade de dominar a tecnologia nuclear. Para esse efeito, o CNPq, acompanhado atentamente pelo Estado Maior das Forças Armadas, pelo Gabinete Militar da Presidência e pelo Conselho de Segurança Nacional, mantém relações com pesquisadores e instituições estrangeiras.

Um almirante, Álvaro Alberto, renomado em sua corporação, bem inserido na reduzida comunidade científica e dispondo de acesso direto ao presidente da República, general Eurico Dutra, lidera os trabalhos de criação do Conselho. Álvaro Alberto conta com a assessoria de professores reputados, entre eles, Carneiro Felipe, da Escola Nacional de Química.

O Almirante representara o Brasil na Comissão de Energia Atômica da ONU, em Nova Iorque, e enfrentara as pretensões norte-americanas de monopólio da tecnologia nuclear; tornara-se o principal formulador da orientação conhecida como política de compensações específicas, pela qual o Brasil forneceria minério radioativo em troca de equipamento e apoio técnico para o enriquecimento de urânio, não se obrigando a manter, neste sentido, relações exclusivas com os Estados Unidos.

O CNPq inaugura a oferta institucional de bolsas no país. Sob a direção de Álvaro Alberto, cerca de 300 bolsas de estudo/pesquisa são implementadas em diversas áreas do conhecimento, sendo os pedidos aprovados diretamente pelo CD, que reúne nomes de grande projeção. A antiga aspiração de estudar a Amazônia é atendida com a criação do INPA.

O Conselho volta-se prioritariamente para os problemas da pesquisa nuclear, o que, no clima da guerra fria, lhe garante o centro das atenções. A posição do Almirante e da maioria dos membros do CD reflete a tendência dita nacional-desenvolvimentista, defensora de empreendimentos estratégicos para o futuro do país. Nesse período, além das instituições de pesquisa e ensino, são criadas entidades voltadas para a busca da autonomia nacional, do desenvolvimento industrial e da redução das disparidades regionais como o BNDE, a Petrobrás e o BNB. O CNPq surge integrando o rol das instituições que encarnam o sonho do Brasil autônomo e moderno.

Indefinições e ameaças

A radicalização do confronto político, fortemente alimentado por pressões externas, é expressa pelo suicídio de Vargas, em 1954. Desde então, a corrente favorável à aproximação com os Estados Unidos ganha terreno. Em 1955, Álvaro Alberto, falsamente acusado de irregularidade na administração financeira, pressionado por Juarez Távora, chefe do Gabinete Militar, pede afastamento da presidência do CNPq. Cientistas renomados, como César Lattes, então dirigente do CBPF, contribuem para o seu desgaste pessoal.

Por indicação de Távora, o engenheiro José Batista Pereira substitui o Almirante e aceita a extinção paulatina das atribuições do CNPq relativas ao programa nuclear autônomo. Como integrante do CD, Pereira combatera anteriormente a política de compensações específicas. Sem inserção na comunidade científica, sem a autoridade moral de Álvaro Alberto, o novo presidente do CNPq sofre resistência de conselheiros. No CD, ecoa vivamente o confronto de idéias sobre os rumos do país.

Juscelino Kubitschek, que assume o governo em 1956, amplia a distância do CNPq das atividades relacionadas à energia nuclear, nomeando o coronel-aviador Aldo da Rosa para dirigir o órgão. Ex-estagiário da aviação naval dos Estados Unidos, íntimo da NASA, admirador assumido da indústria aeronáutica norte-americana, esse oficial é desconhecido dos cientistas brasileiros. Vitimado por um acidente de avião, Aldo Rosa logo é substituído por Christóvão Cardoso, um conservador, avesso à mobilização política do mundo acadêmico e ao apoio a cientistas sociais.(3)

O CNPq amarga então fortes reduções orçamentárias. As dotações vão de 0,28% do orçamento da União, em 1956, para 0,09% em 1960, o que se reflete na quantidade de bolsas implementadas, que cái de 316 para 287. O desgaste do Conselho é ainda ampliado com o acirramento da disputa entre cariocas e paulistas em torno de seus parcos recursos. A entidade é desacreditada exatamente quando os vôos espaciais alimentam o imaginário coletivo acerca das amplas possibilidades da ciência e da tecnologia.

Empenhado em acelerar o desenvolvimento do país, Kubitschek quer resultados de curto prazo, enquanto a formação de capacidade científica demanda tempo, esforços sistemáticos e recursos regulares, como observa Shozo Motoyama. Descontente com a máquina estatal, Kubitschek cria instâncias paralelas e forma “comissões” com autoridade e recursos para executar seus planos relativos às indústrias química, naval e automotora de forma desvinculada da capacidade científica e tecnológica do País.4

Uma iniciativa revela a pouca percepção de Juscelino quanto ao papel estratégico do CNPq na capacitação científica e tecnológica do Brasil: a criação, no Ministério da Educação, de uma Comissão Supervisora do Plano dos Institutos, encarregada de organizar quatorze instituições de pesquisa. Essa Comissão, além de representar uma sobreposição de esforços, leva ao desperdício de recursos financeiros, esvaziando drasticamente as verbas do CNPq. Juscelino ordena ainda a criação de um Instituto de Pesquisas Rodoviárias, de vida efêmera.

Na época, o CNPq chama mais a atenção devido a uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a energia atômica do que por empreendimentos como o apoio aos estudos da flora amazônica, dos cerrados e do semi-árido nordestino, e a compra, em parceria com o Ministério da Guerra, a Companhia Siderúrgica Nacional e a PUC-RJ, do primeiro computador eletrônico instalado no país.

Em 1961, Jânio Quadros nomeia outro almirante, Octacílio Cunha, presidente do Conselho. Esse oficial tenta recuperar o prestígio da instituição recompondo seu orçamento, mesmo que de maneira nada ortodoxa: o Presidente da República ordena à Petrobrás que envie recursos ao CNPq.

O almirante Octacílio, treinado para planejar, como costumam ser os militares modernos de alta patente, assessorado por Antônio Couceiro, dirige a elaboração de um plano qüinqüenal. Nessa ocasião, o CD, pela primeira vez, aborda sistematicamente os problemas que absorverão os formuladores da política científica brasileira nas décadas seguintes: a formação de pesquisadores e suas condições de vida e trabalho; o intercâmbio e a formação de grupos; o amparo às instituições e às publicações científicas; a difusão tecnológica através da absorção, pela indústria, de pesquisadores qualificados; a desarticulação entre as diversas instâncias e instituições vinculadas ao setor; a desconcentração espacial dos investimentos e o estímulo para a fixação de competências no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Cumprindo determinação governamental, Otacílio organiza o Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais - GOGNAE, embrião do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE.

A crise financeira legada por Kubitschek, a instabilidade provocada pelo intempestivo Jânio e as indefinições políticas de Goulart agravam a situação do CNPq. Recursos da Fundação Ford aliviam a crise, mas, no período que antecede o Golpe de 1964, a existência do Conselho é ameaçada. A proposta de reforma administrativa coordenada pelo almirante Amaral Peixoto estabelece que o CNPq se subordinaria ao Ministério da Educação e Saúde. Um projeto de divisão do órgão em duas fundações, uma voltada para a ciência, outra para a tecnologia, é apresentado ao Congresso Nacional. Os pesquisadores, divididos politicamente, não assumem com vigor a defesa da instituição que, outrora, chegara a ser designada como a Casa do Cientista. Após mais de uma década de funcionamento, o CNPq ainda não é uma instituição consolidada.

Sob a ditadura

Os militares assumem o poder discursando contra os comunistas e a corrupção; não têm “programa de governo”, mas uma idéia do país que desejam; pensam, de fato, em acelerar o processo modernizador e construir uma grande potência.

Desde as reformas corporativas ocorridas na Primeira República, os oficiais sentem na pele as fragilidades do país, a ausência de uma indústria capaz de fornecer armas e equipamentos, a inexistência de uma infra-estrutura capaz de permitir operações militares segundo o padrão moderno, as deficiências do ensino fundamental que tanto prejudicam a instrução dos soldados. Em 1964, retornam ao mando discricionário e dão continuidade às mudanças no efetuadas pelo Estado Novo; outorgam-se a condição de legítimos e indiscutíveis detentores da fórmula para desenvolver o país.

A ditadura é pródiga em iniciativas. Dispondo de colaboradores devotados e entrosados com as idéias de agências multilaterais, como o BID, o BIRD e a UNESCO, estabelece uma pletora de projetos, planos básicos, planos especiais, planos integrados, programas, conselhos, comissões, fundos permanentes e fundos especiais, tudo apresentado à maneira redentorista e destinado a afetar todos os aspectos da vida nacional, da política agrária ao sistema educacional; da saúde pública ao planejamento urbano; da preservação do patrimônio histórico à política científica.

Sob a ditadura, o CNPq se firma como instituição de apoio ao desenvolvimento da ciência. O ensino e a pesquisa tornam-se objeto de planejamento e contam com volume de recursos inéditos. Um grande sistema de pós-graduação é implantado, os salários e as condições de trabalho dos professores e pesquisadores são substancialmente melhorados; a participação da comunidade científica nas atividades da CAPES e do CNPq é possibilitada pelo reconhecimento institucional das áreas do conhecimento e a subseqüente organização da avaliação do mérito cientifico por meio do julgamento pelos pares.

Já no primeiro ano do regime militar, ficam superadas as indefinições quanto à sobrevivência do CNPq. Por orientação do general Castello Branco, são sepultadas as tentativas de criar um ministério da ciência e tecnologia ou ainda a de substituir o órgão por duas fundações públicas. O presidente do CNPq, Antonio Couceiro, que mantinha entendimentos diretos com o General, explica ao Conselho Deliberativo a vantagem de a Presidência da República garantir o controle da instituição: se, realmente, a pesquisa científica é a arma para promover, dirigir e acelerar o desenvolvimento, deve estar sob o domínio e sob o controle do governo. (5)

O argumento de Couceiro contra a criação de um Ministério da Ciência e Tecnologia revela a amplitude do papel que os governantes concebiam para o órgão. Caso o ministério fosse criado, afirmava Couceiro, haveria uma disputa de competências. Quem programaria, indagava, pesquisas na agropecuária e na educação? O Ministério da Ciência e Tecnologia, da Agricultura ou da Educação? Ao CNPq, portanto, estaria destinado a articulação de atividades de vários ministérios. (6)

O Presidente do CNPq esclarece a orientação governamental: o Brasil está precisando no momento, e durante um tempo que não é curto, muito mais de ciência e de cientistas do que de um ministério da ciência. Ligado depois à poderosa Secretaria de Planejamento da Presidência da Republica, encarado como arma para o desenvolvimento e contando com recursos do BNDE, o CNPq volta-se para a pós-graduação, pretendendo dirigir um sistema nacional de ciência e tecnologia em gestação. Os generais determinam a criação de secretarias de ciência e tecnologia em pastas ministeriais, ampliam a rede de universidades federais e levam os governos estaduais a apoiar a pesquisa.

O autoritarismo garante estabilidade à administração do CNPq: nos treze anos que precedem o golpe de 1964, o órgão fora dirigido por seis presidentes; nos 21 anos de ditadura, por apenas cinco. Aliás, ninguém permaneceria tanto tempo como presidente quanto Couceiro (1964-1970), que lhe imprime capacidade de planejamento e execução de programas, recebe regularmente recursos importantes e consolida sua estrutura funcional. Através do CNPq, o Estado passa a interferir de forma mais global e sistemática na produção do conhecimento e a contribuir com a modernidade aspirada pelo comando militar.

Ainda em 1964, apesar da política de contração econômica, é criado, no BNDE, o Fundo de Desenvolvimento Técnico-Científico e o CNPq recebe mais recursos que nos quatro anos anteriores. Em 1967, no bojo de um Plano Estratégico de Desenvolvimento, os governantes estabelecem um Plano Básico da Pesquisa Científica e Tecnológica. Em 1968, o CNPq adota um Plano Qüinqüenal para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

Preocupados com a inovação tecnológica, ou seja, com a transformação de conhecimentos em produtos ou serviços comercializáveis, os governantes criam a Financiadora de Estudos e Projetos- FINEP, em 1967. No ano seguinte, a EMBRAER. Em 1969, instituem o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e, em 1972, estabelecem o Primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento- PND, que enseja o Primeiro Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - PBDCT. Em 1975, surgem o II PND e o II PBDCT; o último da série, que, aliás, já não reproduz as mesmas concepções dos primeiros, aparece em 1980.

A oferta de bolsas, que em 1964 não chegava a quatrocentas unidades, sendo mais da metade na modalidade iniciação científica, sobe para cerca de treze mil em 1985. Nesse ano, a modalidade de bolsa mais beneficiada é a de pós-graduação, com cerca de cinco mil bolsas. A formação de professores e pesquisadores de alto nível através de programas de pós-graduação é estabelecida como a grande prioridade do primeiro plano qüinqüenal (1968-1972), que pretendia triplicar, no mínimo, em cinco anos, o efetivo de cientistas no país.(7)

A aproximação com os Estados Unidos iniciada, após o afastamento de Álvaro Alberto em 1955, ampliada no governo Juscelino e confirmada no período de Goulart, toma ritmo acelerado nos governos militares, incluindo domínios delicados como o da pesquisa aeroespacial. Em 1968, enquanto o mundo acadêmico se agita contra o acordo MEC-USAID, o Conselho negocia convênios com a National Academy of Science e o National Research Council.

Comentando a disposição do governo norte-americano para investimentos em pesquisa na América Latina por meio de bancos multilaterais, Couceiro manifesta contentamento e esperança: "É chegado o momento de o governo americano confiar no trabalho que os pesquisadores deste país realizaram."(8) As negociações passam obrigatoriamente pela avaliação do Estado Maior das Forças Armadas ecompreendem diversas atividades consideradas estratégicas como a botânica, a produção agrícola, os recursos minerais e a computação.

É durante a ditadura que o CNPq se envolve com as grandes mudanças no panorama agrícola brasileiro. Sob a orientação de organismos multilaterais, em particular o Banco Mundial, os governantes abraçam vigorosamente a bandeira do desenvolvimento rural integrado que, sem redistribuir a terra e a renda, sem alterar a concentração espacial da riqueza ou propiciar melhorias na qualidade de vida da maioria dos trabalhadores, agrega vastas porções da zona rural ao desenvolvimento econômico sustentado pelo regime.

O uso da ciência e da técnica para favorecer a exploração agrícola das zonas semi-árida e de cerrados, cogitada durante a presidência do almirante Octacílio Cunha e esboçada sob a direção de Couceiro, torna-se objeto de programas oficiais sob o comando do general Arthur Mascarenhas Façanha, nomeado presidente do CNPq pelo general Garrastazu Médici em 1970. (9)

Entre as justificativas desses programas estão a descentralização das atividades da pesquisa e a integração do território nacional. O CNPq passa a atuar com órgãos como a SUDENE, a SUDAM, o DNOCS e a CODEVASF. Carecendo de técnicos para o gerenciamento de seus planos, o regime incentiva, por intermédio do CNPq e da CAPES, a formação de planejadores e cientistas sociais voltados para o desenvolvimento. Sociólogos, historiadores, cientistas políticos e antropólogos, tradicionalmente afastados dos benefícios do CNPq, recebem inédito apoio institucional. Paralelamente, sob a coordenação de Frota Moreira, o órgão cria um programa de estudos de endemias, com destaque para a esquistossomose e a doença de chagas.

Um dos problemas mais delicados enfrentados pelo CNPq durante o regime militar é a evasão de cientistas. Nos primeiros anos da ditadura, a direção do órgão procura diretamente pesquisadores que tencionam deixar o país. (10) O agravamento das tensões após o Ato Institucional n. 5 leva o CNPq a organizar uma denominada operação retorno, oferecendo isenção de tarifas de importação para os bens dos que trabalham no exterior.

A partir de 1970, o general Arthur Façanha, um ex-diretor da Escola Militar de Engenharia, contando com a colaboração de cientistas respeitados, entre eles o matemático Maurício Matos Peixoto, vice-presidente do órgão, empenha-se na reaproximação dos pesquisadores. Entretanto, o acirramento da repressão policial atemoriza os cientistas e até a SBPC, que apoiara os investimentos governamentais na pesquisa, denuncia as violências.

Durante o governo do general Ernesto Geisel (1974-1979), o CNPq, sob a presidência de José Dion de Melo Teles, um engenheiro formado pelo ITA, muda de denominação para Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, torna-se uma fundação pública de direito privado e sofre alterações funcionais. A sede é transferida do Rio de Janeiro para Brasília e seu Conselho Deliberativo, onde historicamente tinham assento membros destacados da comunidade científica, é extinto.

Reproduzindo o estilo imperial, marca do governo Geisel, respaldado por Golbery do Couto e Silva e dispondo de recursos continuamente ampliados, o presidente do CNPq, sem reconhecimento na comunidade científica, dirige um Conselho Científico e Tecnológico (CCT), espécie de comissão interministerial com atribuições de coordenar um vasto sistema nacional de ciência e tecnologia.

Mas, em 1975, por ocasião do lançamento do Primeiro Plano Nacional de Pós-Graduação, quando o País já dispunha de 551 cursos de mestrado e 200 de doutorado, o CNPq reduz sua capacidade de interferir no ensino. Até então, o órgão apoiara diversos programas sem ter em conta o papel da CAPES, tida inclusive por Couceiro como entidade de critérios duvidosos. (11) Paralelamente, o CNPq, organiza os comitês assessores, que materializariam a avaliação do mérito científico por meio do julgamento de pares.

Na primeira fase do regime militar, a CAPES, além de viver indefinições institucionais e programáticas, é abalada pela freqüente mudança de seus dirigentes, por disputas internas e pela ingerência de parlamentares na implementação das bolsas de estudo. Apenas em 1977, a entidade institucionaliza a avaliação dos programas de pós-graduação por comissões formadas por membros da comunidade acadêmica.

Trata-se de um momento fundamental na institucionalização da atividade científica no país. A partir de uma classificação das áreas do conhecimento científico iniciada pelo CNPq em 1974 e concluída em 1976, a avaliação pelos pares adotada por instituições públicas configura não apenas o reconhecimento formal dos campos de trabalho dos cientistas, mas, sobretudo, o acatamento da autoridade intelectual para efeito de aferição de mérito. O pesquisador, certamente, não define prioridades e programas governamentais nem interfere em aspectos administrativos, mas a autoridade governamental já não pode escolher unilateralmente os beneficiários do auxílio ou do investimento público. O comitê assessor, organizado por área do conhecimento, é o mecanismo-chave na mediação entre a vontade do Estado e a do produtor de conhecimento. Não por acaso, é adotado exatamente quando o regime militar vive seu momento de profundo desgaste e reconhece a necessidade de preparar a transição para a democracia.

Em 1979, refletindo o avanço na qualificação do mundo acadêmico brasileiro propiciado pelo regime militar, o CNPq, sob a direção de Mauricio Matos Peixoto, cria a bolsa de pós-doutorado.

No ocaso do período militar, outro engenheiro, Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque, assume a presidência do CNPq. Administrador público experiente, engajado no esforço pelo desenvolvimento do Nordeste, Lynaldo ganhara a simpatia de muitos pelas oportunidades que proporcionara, como reitor da Universidade Federal da Paraíba, a professores perseguidos pelo regime. Apesar das dificuldades financeiras e dos efeitos corrosivos da inflação, Lynaldo implementa numerosos programas tendo em vista a absorção de tecnologia pelo setor produtivo (depois designada como inovação) e retoma a velha bandeira da redução das disparidades regionais. Neste sentido, envolve particularmente as universidades. Acreditando firmemente nas virtudes do Estado como planejador do desenvolvimento socioeconômico, Lynaldo procura favorecer a capacidade do CNPq na formulação da política científica brasileira e, a despeito da centralização de decisões que marca seu trabalho, convive respeitosamente com a comunidade científica.

É nesse período que a entidade multilateral de maior capilaridade, o Banco Mundial, deixa sua marca na produção de conhecimento no Brasil. Em 1984, é assinado o convênio que estabelece o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico - PADCT, objetivando complementar os recursos destinados pelo Estado à pesquisa científica. Como em todos os convênios assinados pelo Banco Mundial, ao contratante de empréstimos cabe assumir a maior parte do valor financeiro do programa. Mais do que recursos, o Banco Mundial oferece, a título de ajuda, paradigmas, conceitos e procedimentos conforme um receituário estabelecido para todos os países em que atua.

Em duas décadas de regime discricionário, os militares alteram significativamente o País. O Brasil é urbanizado; a infra-estrutura econômica, ampliada; os setores produtivos, diversificados; a capacidade dos meios de comunicação e transporte, multiplicada. Muitos brasileiros passam a se perceber integrantes de uma comunidade nacional, não obstante o aprofundamento das desigualdades sociais e regionais. As mudanças, certamente, também não reduzem a vulnerabilidade da economia à vontade estrangeira, não consolidam um sistema de defesa do território, não resguardam a riqueza nacional para os brasileiros nem protegem o meio ambiente. Mas o Brasil é outro, inclusive no que diz respeito à capacidade de produzir conhecimento.

O retorno à democracia

No Estado democrático, o CNPq encontrará, a partir de 1985, além de questões que já afligiam seus fundadores após a Segunda Guerra mundial, a herança do autoritarismo e os desafios da cena internacional marcada pelo fim da guerra fria. O País amarga a crise da dívida externa, o déficit público, a inflação crescente e fica na condição de exportador líquido de capital. Para assegurar o seu desenvolvimento e soberania, o Brasil precisa continuar ampliando a infra-estrutura de ciência e tecnologia, formar cada vez mais quadros e acompanhar o melhor possível o avanço da produção mundial de conhecimento.

O debate sobre os rumos do país deixa em evidência o distanciamento entre as atividades científicas e as demandas sociais. O crescimento acelerado das grandes cidades, além de reproduzir a histórica desigualdade de renda e oportunidades, faz emergir um grande leque de problemas a ser estudado e enfrentado, com destaque para as condições de moradia, os problemas sanitários, a dificuldade de transporte, a degradação ambiental e o que o jargão da época designava como marginalidade social.

A concentração institucional e geográfica da produção de conhecimento, diagnosticada pelo almirante Octacílio Cunha antes do golpe de 1964, não fora atenuada pelas iniciativas compensatórias do regime militar. O problema se torna até mais visível por conta da demanda induzida: a ditadura instalara universidades federais em todas as unidades da Federação que, agora, querem qualificar quadros e pesquisar. A concentração de investimentos em poucas universidades do Sudeste torna-se particularmente incômoda.

A Amazônia, que passara a ser objeto de exploração econômica mais intensificada, persiste sem programas sistemáticos de pesquisa; o Semi-Árido, transfigurado pelas rodovias e pela energia elétrica, persiste com seus insuportáveis problemas sociais, entre eles, a inacessibilidade dos trabalhadores rurais à formidável reserva de água acumulada artificialmente. O planejamento regional do regime militar não propiciara uma diversificação de atividades capaz de valorizar os múltiplos recursos naturais e a criatividade da cultura sertaneja.

No rol da herança da ditadura, resta ainda a absorção de pesquisadores que, por conta de perseguição política ou interesse profissional, trabalham no exterior. O estabelecimento de uma agenda para a política científica e tecnológica, entretanto, é dificultado pela ausência de um projeto democrático de país. O conjunto heterogêneo de forças que agora governa o Brasil não fixa uma linha programática clara, perde-se no enfrentamento do processo inflacionário e na administração de crises conjunturais.

A pasta de Ciência e Tecnologia é entregue pelo presidente Sarney (1985-1990) a Renato Archer, ex-militar, admirador de Álvaro Alberto. Em sua longa carreira parlamentar, Archer se firmara como defensor do desenvolvimento autônomo e baseado em tecnologia própria.

O MCT surge formalmente com atribuições pouco precisas, como a de cuidar do patrimônio científico e tecnológico, elaborar e conduzir a política para o setor e formular a política nacional de informática. Os programas relativos à energia nuclear e à pesquisa espacial, que os militares haviam desenvolvido secretamente e à revelia da comunidade acadêmica, escapam das atribuições do novo ministério. O mesmo ocorre com os investimentos em pesquisa realizados pelas grandes empresas estatais, que atuam sem conexão com as agências de fomento da produção científica e tecnológica.

Archer define como prioridades a pesquisa em informática, biotecnologia, novos materiais, química fina e mecânica de precisão; empenha todo o seu prestígio pessoal na obtenção de recursos para o Ministério e ganha o centro das atenções com a defesa da política de informática. O CNPq, dirigido por Roberto Santos, um médico que governara a Bahia durante o regime militar, cede seus quadros para a montagem do MCT e fica com atribuições reduzidas. Mas seu presidente não abdica de formular a política científica para o país, pretendendo inclusive atuar em áreas de outros ministérios, como a formação de professores para cursos profissionalizantes do ensino médio.

Roberto Santos firma como prioridades para o órgão a tecnologia de alimentos de consumo popular, a fabricação de imunobiológicos e de insumos para medicamentos que o país não produzia, o tratamento de água servida e a tecnologia para construção de casas populares. Além disso, pretende que o CNPq se envolva no apoio técnico-científico à expansão da agricultura irrigada no vale do São Francisco, opção de desenvolvimento regional assentada desde o Império, sempre com resultados inócuos para atenuar as agruras da população rural do Nordeste.

As proposições de Roberto Santos, além de representar uma alteração significativa na atuação do CNPq, tradicionalmente voltado para a pesquisa básica, não correspondem exatamente às prioridades definidas por Renato Archer. A disputa de competência, prevista vinte anos antes por Antônio Couceiro, emerge, contundente, na Nova República.

O político baiano dirige por pouco tempo o CNPq, sendo substituído por Crodowaldo Pavan. Renato Archer deixa o Ministério em outubro de 1987, seguindo-se um período tumultuado, com mudanças sucessivas de ministros, indefinições institucionais, redução de verbas e perturbações decorrentes das políticas anti-inflacionárias.

Pavan utiliza, com sucesso, o talento de articulador político desenvolvido na presidência da SBPC e consegue suplementações orçamentárias para a ampliação do número de bolsas. O crescimento foi significativo: em 1986, o CNPq concedia 13.628 bolsas-ano; em 1990, passa a conceder 28.696. Restabelecido o Conselho Deliberativo, a comunidade acadêmica volta a ter voz na condução do órgão; até processos administrativos, outrora de atribuição exclusiva da Diretoria Executiva, passam a ser discutidos no colegiado. Entretanto, persiste a dificuldade para definir com nitidez uma linha de atuação e mesmo o papel institucional. O problema é agravado pela ausência de interlocutores qualificados no MCT. (12)

No tempo liberal

A posse de Collor de Mello, em 1990, inaugura um período de revisão intensiva no aparelho de Estado conforme as novas orientações das agências multilaterais. As instituições governamentais, tidas como ineficientes, perdulárias e subservientes a interesses corporativos do servidor público, representariam o grande entrave ao desenvolvimento do país. Collor, mesmo propiciando inicialmente grande tumulto administrativo, inicia profundos e alongados movimentos de retração da capacidade de intervenção do Estado e, paralelamente, de avanço do interesse privado sobre o negócio público. Os movimentos, conjugados, são apresentados como inerentes ao padrão moderno. As expressões primeiro mundo e modernidade tornam-se usuais para expressar os objetivos propostos ao país, sendo inclusive absorvidas por muitos dos que se opõem a Collor.

Gerhard Jacob e Marcos Luiz de Mares Guia, dirigentes do CNPq nomeados pelo novo presidente, mesmo não acompanhando seus arroubos liberais, mostram-se afinados com as idéias em voga. Jacob, um físico-matemático dedicado à cooperação científica entre o Brasil e a Alemanha, considera a abertura econômica benéfica à ciência do País dado que empresários brasileiros, obrigados a competir no âmbito internacional, investiriam em pesquisa; Mares Guia, um bioquímico-empresário, toma o divórcio entre a pesquisa e o setor produtivo como o grande entrave ao progresso brasileiro. Ambos querem favorecer a iniciativa privada voltada para produtos de alta complexidade e protagonizam sérios conflitos com os funcionários do CNPq.

Jacob e Mares Guia, profissionais reconhecidos pela comunidade acadêmica, manifestam desconforto com o funcionamento de comitês assessores, instância-chave do processo de julgamento do mérito pelos pares, já então plenamente consagrado. A movimentação de numerosos cientistas no CNPq escolhendo, bem ou mal, os projetos merecedores de apoio público nas diversas áreas do conhecimento restringe-lhes a capacidade de arbítrio. O Conselho Deliberativo do CNPq, a presença, na Diretoria Executiva, de experientes cientistas como Lindolpho de Carvalho Dias e Jorge Guimarães e, sobretudo, a cultura desenvolvida pela comunidade, asseguram a continuidade dos comitês assessores. (13)

Jacob e Mares Guia enfrentam grandes problemas financeiros. A falta de meios impede novas iniciativas de fomento e compromete o pagamento de bolsas concedidas. Marcos Mares Guia, remanejando os parcos recursos das diversas modalidades de bolsas, acatando sugestão de Jorge Guimarães, introduz uma novidade, a taxa de bancada, como forma de atenuar as dificuldades das pesquisas em andamento. Apesar da penúria, com o empenho pessoal de seus presidentes, o CNPq amplia significativamente o número de bolsas, mesmo que com valores sempre aviltados por conta da inflação: se, em 1990, as unidades implementadas somam 28.696, em 1993, chegam a 40.955. Mares Guia envolve o CNPq no esforço pelo desenvolvimento da informática por intermédio do Programa Nacional de Software para Exportação – SOFTEX 2000 e toma iniciativas visando informatizar a administração da agência.

Os enfrentamentos com o corpo de servidores refletem mais que a insatisfação com o aperto salarial da época: revelam o espírito de corpo de funcionários crescentemente qualificados do ponto de vista técnico e acadêmico e interessados em desempenhar papel como formuladores políticos. A indefinição do governo quanto à instância responsável pela política brasileira de ciência e tecnologia contribui para mobilizar os funcionários no sentido de garantir espaço na estrutura da administrativa. O Ministério de Ciência e Tecnologia sofre com a inconstância de seus titulares e as mudanças de orientação programática.

As dificuldades financeiras e a imprecisão do papel do CNPq agravam-se quando Fernando Henrique Cardoso assume o governo e nomeia Israel Vargas ministro da Ciência e Tecnologia. Sob a direção de Galizia Tundisi (1995-1999), um limnologista-empresário voltado para a gestão dos recursos naturais, o CNPq, mesmo sem recursos assegurados e com imprecisões sobre o seu papel, define programas que, na ótica de Tundisi, seriam relevantes para o desenvolvimento brasileiro. Julgando a comunidade científica incapaz de repensar suas atividades no sentido de apoiar um desenvolvimento sólido e consistente para o país, Tundisi se envolve no planejamento nos moldes do chamado programa Avança Brasil, proposto por Fernando Henrique, apresentado como marco da retomada do planejamento estratégico por meio de planos de investimentos estabelecidos a cada três anos (os PPAs).

Tundisi recupera a prática desenvolvida pelo órgão no final do regime militar, quando Dion e Lynaldo apóiam pesquisas visando alterar o padrão socioeconômico. (14)

A atuação mais notória do CNPq nesse sentido foi o apoio ao agro-negócio. Em convênio com o Ministério da Agricultura, Tundisi quer apoiar a irrigação de um milhão de hectares no Nordeste, transformando-o em exportador de frutas. A proposição, amparada numa concepção de desenvolvimento regional condenada pela experiência histórica, é particularmente estranha quando formulada por quem se preocupa com o meio ambiente: sendo a fruticultura irrigada voraz consumidora de água, tratar-se-ia de dar à região de menor disponibilidade hídrica a condição de exportadora de água sem que, não obstante, os volumosos mananciais acumulados artificialmente no semi-árido chegassem à população necessitada. Uma política científica voltada para as necessidades sociais deveria necessariamente ter em vista, além do abastecimento humano, a diversificação das atividades produtivas privilegiando mercadorias de valor agregado.

Os rumos do CNPq deixam a comunidade científica desesperançada. Se os ajustes estruturais na economia durante o primeiro mandato de Fernando Henrique reduzem as verbas do CNPq para bolsas e fomento de cerca de 500 milhões de reais, em 1995, para 441 milhões, em 1999, o planejamento de Tundisi resulta numa forte retração da oferta de bolsas. No período 1995-1999, o número de bolsas-ano implementadas é reduzido de 52.041 para 41.969, sendo as bolsas de mestrado e de produtividade em pesquisa as mais afetadas. A redução é particularmente perturbadora tendo em vista que, no período, os cursos de pós-graduação saltam de 1.775 para 2.158.

Frente às dificuldades financeiras e na esteira das privatizações em setores estratégicos da economia como a exploração do petróleo, as telecomunicações e a energia elétrica, Israel Vargas busca uma nova forma de financiamento da pesquisa desvinculada dos recursos do Tesouro Nacional. Em 1997, a Lei que cria a Agência Nacional do Petróleo - ANP, estabelece que parcela dos royalties da produção de petróleo e gás seja destinada à pesquisa. Em 1999, é implantado o primeiro Fundo Setorial, dito CT-Petro.

Administrando a penúria e seguindo orientações do Banco Mundial, Israel Vargas procura apoiar os pesquisadores de elite. Inspirado no modelo dos laboratórios associados do Centre National de Recherche Scientifique, da França, organiza o Programa de Núcleos de Excelência – PRONEX, a ser gerido pelo CNPq. Lindolpho de Carvalho Dias preside a comissão organizadora do PRONEX, que conta, entre outros, com Moysés Nussenzveig, Gilberto Velho, Antonio Cecchelli e Evando Mirra. A iniciativa, que reforçaria a histórica tendência de concentração espacial dos investimentos, não é seguida de medidas compensatórias.

Em 1999, quando Fernando Henrique Cardoso nomeia Bresser Pereira ministro da Ciência e Tecnologia, o CNPq vive momento de grande confusão administrativa. Anteriormente, como ministro de Administração e Reforma do Estado, Bresser dirigira uma reforma administrativa gerencial reduzindo o aparelho de Estado em favor do setor privado. Bresser pretendera, inclusive, fundir o Ministério da Ciência e Tecnologia com o da Educação. Agora, concentrando o mando no setor de ciência e tecnologia, acumula os cargos de ministro e presidente do CNPq. Sua proposta para imprimir maior racionalidade à concessão de bolsas e auxílios e reduzir conflitos administrativos é a adoção de um sistema rotativo em que três vice-presidentes, Evando Mirra, Fernando Reinach e Denis Rosenfield, revezar-se-iam no cargo em interstícios de seis meses. A iniciativa, desrespeitando a experiência firmada durante décadas, assusta os servidores e a comunidade, sendo logo abandonada. Quanto a ações programáticas, Bresser simplesmente, nada acrescenta.

Nos últimos anos de mandato de Fernando Henrique, o embaixador Ronaldo Sardenberg, ministro da Ciência e Tecnologia, retoma os trabalhos para a implantação dos Fundos Setoriais. A iniciativa enquadra-se no ideário de redução do financiamento das políticas públicas: trata-se de atenuar as obrigações do Tesouro Nacional em relação à produção de conhecimento.

Na expectativa de maiores aportes à pesquisa, a iniciativa é saudada como benfazeja pela comunidade científica, por meio da ABC e da SBPC. Os recursos que alimentam os fundos são de origens variadas como parcelas de royalties, de receitas de empresas beneficiárias de incentivos fiscais e da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE). A gestão desses fundos é submetida a comitês integrados por representantes de ministérios, agências reguladoras, cientistas e empresários. O CNPq, indicando um representante nesses comitês, pouco interfere em suas decisões.

A possibilidade de os Fundos favorecem a concentração geográfica e institucional de investimentos é agora enfrentada com a fixação de percentuais obrigatoriamente destinados às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

À revelia do que possam oferecer ao combalido sistema nacional de ciência e tecnologia, os fundos setoriais, objetivamente, reduzem a capacidade do CNPq e do próprio MCT de contribuir na formulação da política de ciência e tecnologia: os novos recursos integram o Fundo Nacional de Ciência e Tecnologia (FCDCT), mas têm finalidades pré-estabelecidas, são destinados ao financiamento de programações específicas. Além disso, a criação do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos - CGEE, organização social mantida pelo MCT para assessorar sua orientação programática por meio de estudos prospectivos do desenvolvimento científico internacional e de definição de oportunidades de investimentos, restringe ainda mais a possibilidade de o CNPq influir no destino dos novos recursos. O CGEE é concebido, objetivamente, como entidade formuladora da política científica brasileira.

Evando Mirra deixa a presidência do CNPq para dirigir o CGEE em 2000, quando se inicia a implementação dos Fundos Setoriais, sendo substituído por Esper Abrão Cavalheiro. Ao tempo em que o CNPq deixa de abrigar institutos de pesquisas, alguns transformados em organizações sociais, firma-se como repassador de recursos para pesquisas provenientes de convênios com diversos ministérios.

A orientação do BIRD, de fomentar a excelência, já manifesta no PRONEX, prossegue agora com um instrumento de apoio aos que operam com a fronteira do conhecimento, os Institutos do Milênio, que visam integrar em rede grupos de pesquisadores brasileiros de alto padrão de qualidade internacional. Em setembro de 2001, é organizada uma Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, cujas conclusões são resumidas num Livro Branco. Esse documento retrata as idéias hegemônicas no período em que o Brasil é governado por Fernando Henrique Cardoso. Além de relatar antigos problemas, o Livro Branco retoma noções comezinhas acerca do papel da ciência na sociedade moderna e sugere que o aumento da competitividade internacional das empresas brasileiras deve ser encarado como política do Estado. Lembrando Cazuza, o texto é um museu de grandes novidades, com destaque para a defesa da vinculação entre a atividade científica e o setor produtivo.

As afirmações de fé no futuro contidas no Livro Branco se contrapõem à dura realidade enfrentada pelo pesquisador brasileiro. Desde sua fundação, o CNPq nunca é tão limitado para conceder bolsas e auxílios quanto no período em que Fernando Henrique governa o Brasil. Entre 1995 e 2002, o número de bolsas-ano que implementa é reduzido de 52.041 para 47.465, sendo as bolsas de mestrado as mais afetadas, passando de 10.960 para 5.604. O quadro é mais grave quando se considera a não reposição das perdas inflacionárias e a suspensão da taxa de bancada.

A disposição governamental segue claramente na contramão do empenho revelado pela comunidade científica, manifesta, sobretudo, no crescimento ininterrupto do sistema de pós-graduação. A titulação de doutores por ano no País salta de 2.497, em 1995, para 5.335, em 2000, mas a oferta de bolsas de produtividade em pesquisa fica praticamente estagnada, passando de 8.170 para 8.601. Um número ínfimo de doutores em atividade no país pode, concretamente, chegar à condição de pesquisador do CNPq.

As oportunidades para os jovens pesquisadores são crescentemente limitadas, mesmo com a criação de uma nova modalidade de bolsa, a de recém-doutor. O acirramento da disputa entre os pesquisadores dificulta a avaliação do mérito de projetos e dos índices de produtividade acadêmica. O recurso crescente à avaliação por índices quantitativos em detrimento de aspectos qualitativos torna-se inevitável. Mais uma vez, as regiões que concentram pesquisadores menos titulados, com poucos programas de pós-graduação e menor infra-estrutura, são prejudicadas.

Em busca de novos rumos

A recuperação da capacidade operativa da principal agência brasileira de fomento à ciência e a tecnologia tem início em 2003, no governo de Luís Inácio Lula da Silva. Roberto Amaral, ministro da Ciência e Tecnologia, à revelia de composições político-partidárias, indica para dirigir o órgão o médico parasitologista Erney Camargo.

Os recursos destinados a bolsas tem um incremento de 9,5%, em 2003, e de 13,4% em 2004. Em 2003, pela primeira vez, em quase uma década, o valor das bolsas sofre reajuste (18%) e as dificuldades dos pesquisadores são atenuadas através de complementações como o restabelecimento da taxa de bancada e a criação do grant, forma de subvenção consagrada nos Estados Unidos. O número de bolsas-ano, que, em 2002, era de 47.464, sobe para 49.803, em 2004. As oportunidades para os pesquisadores são ampliadas com o lançamento contínuo de numerosos editais, com recursos provenientes de fontes diversificadas. Entre os editais, alguns se destacam pela originalidade, apesar de recursos relativamente modestos, como os que beneficiam as ciências humanas e a preservação de acervos históricos da produção do conhecimento científico.

O sistema de avaliação por pares torna-se mais eficaz e transparente com a atualização, pelo Conselho Deliberativo do CNPq, das normas de composição e de funcionamento dos comitês de assessoramento. Enquanto a Diretoria do CNPq garante a autonomia e a autoridade dos cientistas nos julgamentos, torna públicos seus nomes e os critérios de avaliação utilizados. Além disso, alguns comitês temáticos são criados para atender a demandas prejudicadas pela inaptidão dos comitês tradicionais.

O enfrentamento do incômodo problema da concentração regional de investimentos é conduzido de forma inovadora, pela indução de associações entre programas de pós-graduação bem avaliados pela CAPES com cursos emergentes nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Mas, no enfrentamento da desigualdade regional, nenhuma iniciativa supera a do fortalecimento das agências estaduais de fomento. O CNPq oferece múltiplas oportunidades de convênios com todas as fundações estaduais de amparo à pesquisa do país visando à consolidação de grupos de excelência, à fixação de pesquisadores titulados nos estados menos desenvolvidos, à oferta de condições operacionais para pesquisadores em início de carreira e ao estímulo a jovens talentosos do ensino médio. A substituição do ministro Roberto Amaral por Eduardo Campos, em janeiro de 2004, não tolhe Erney Camargo na condução destas iniciativas.

As desigualdades espaciais da produção do conhecimento científico resultam, essencialmente, da natureza do sistema capitalista e da postura do Estado que, ao longo da história brasileira, concentra seus investimentos nos espaços agro-exportadores. A omissão de governos estaduais, por sua vez, ajuda a consolidar a tendência à desigualdade. A experiência de São Paulo, com a FAPESP, mostra como os governantes estaduais podem desempenhar papel relevante no apoio ao desenvolvimento científico. Ao celebrar convênios com fundações estaduais, o CNPq não apenas amplia os recursos destinados à pesquisa, mas, sobretudo, propicia a emergência ou a consolidação de novos e importantes agentes de fomento à pesquisa no Brasil.

As mudanças no CNPq são complexas, transcendem a interregnos governamentais e conjunturas políticas; dependem de transformações sociais, da evolução do conhecimento e de estratégias do Estado. Os chamados ajustes estruturais na economia, por exemplo, perseguidos desde que, nos anos 1990, as forças políticas hegemônicas decretam a falência do nacional-desenvolvimentismo, degradam a qualidade do emprego do pesquisador e restringem a atuação do CNPq, mas não lhe atingem a personalidade. Trata-se de uma peça do aparelho de Estado inconcebível sem a participação de profissionais passíveis de indução, não de algemas.

Regimes políticos, mudanças de governo, estilos e idiossincrasias de dirigentes, por mais que o afetem, não alteram sua vocação de mediador de fortes vontades, a do político e a do cientista, ambos dependentes de legitimação pela comunidade nacional. Quaisquer que sejam as avaliações possíveis sobre a trajetória do CNPq, não cabe outra conclusão senão a de que essa entidade é um esteio do Brasil moderno.


Notas:

1.Por bolsa-ano, entenda-se não o número de beneficiários, mas de mensalidades pagas durante um ano.

2.Logo em seguida, o CNPq cria o Instituto de Matemática Pura e Aplicada – IMPA e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia que, depois, incorpora temporariamente o Museu Emílio Goeldi.

3.A propósito, ver suas manifestações nas sessões do CD, em 1957.

4.A observação de Motoyama está 50 anos do CNPq: contados por seus presidentes, São Paulo, FAPESP, 2002, p.119.

5.Sessão CD 733, 14/07/64.

6.Sessão CD 758, 14/12/64.

7.Pronunciamento de Antônio Couceiro na 929ª sessão do CD, em 04.06.1968.

8.Pronunciamento de Antônio Couceiro na 907ª sessão do CD, em 23.01.1968.

9.Entre os programas então estabelecidos destacam-se o Programas do Trópico Úmido, do Trópico Semi-Árido, o de Pesquisas de Utilização dos Cerrados.

10.Pronunciamento de Antônio Couceiro na 864ª sessão do CD, em 27.04.1966.

11.Entre as diversas manifestações de desconfiança em relação a CAPES, uma das mais severas ocorre na 956a sessão do CD, em 21.01.1969.

12.Pavan, em entrevista a um grupo de professores organizados por Shozo Motoyama, declara que teria ampliado o numero de bolsas de 13 para 44 mil bolsas. Na verdade, está se referindo a uma cota fixada em lei, que não foi efetivada. Na mesma entrevista, Pavan relata seus conflitos com os ministros da Ciência e Tecnologia.

13.Entrevista a Renato Vargas, in Motoyama, op.cit.

14. Tundisi disserta sobre suas idéias e proposições em entrevista concedida a equipe de Motoyama (op.cit).



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